quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

To Love Again (The Duets) - CHRIS BOTTI


1 Embraceable You (G. Gershwin / I. Gershwin)   4:27 
2 What Are You Doing The Rest Of Your Life? (M. Bergman / A. Bergman / M. Legrand) featuring Sting   5:06
3 My One And Only Love (G. Wood / R. Mellin) featuring Paula Cole   5:41
4 Let There Be Love (I. Grant / L. Rand) featuring Michael Bublé   3:13
5 What's New? (J. Burke / R. Haggart)   3:59
6 Good Morning Heartache (I. Higginbotham / D. Fisher / E. Drake) featuring Jill Scott   6:13
7 To Love Again   4:38
8 Are You Lonesome Tonight? (R. Turk / L. Handman) featuring Paul Buchanan   4:00
9 Lover Man (James E. Davis) featuring Gladys Knight   4:50
10 I'll Be Seing You (S. Fain)   4:18
11 Pennies From Heaven (J. Burke / A. Johnston) featuring Renee Olstead   3:47
12 Here's That Rainy Day (J. Burke / Jimmy V. Heusen) featuring Rosa Passos   5:05
13 Smile (C. Chaplin) featuring Steven Tyler   4:23  

Tendo em consideração que "To Love Again" é um álbum de duetos que conta com a relevante participação de nove vozes convidadas, cujos percursos incluem desde jazz e a soul ao rock e à pop, é difícil não descartar algum intento comercial para esta edição mas trata-se na realidade de um trabalho exímio, produzido dentro da melhor tradição do jazz com orquestra. Editado em 2006 como o décimo registo oficial do trompetista norte americano Chris Botti, o álbum é preenchido com a interpretação de doze standards com a exceção da peça homónima, original de Botti, e cujo título ajuda a transmitir algum caráter romântico a este trabalho. A serenidade e excelência de uma sonoridade límpida, definida e cristalina, faz de Botti um músico acessível para audiências menos exigentes não havendo por isso qualquer motivo para lhe retirar algum mérito ou prestígio musical mas sim a consideração de um trabalho de classe feito com brio e grande respeito pelo género. 
"To Love Again" manifesta-se como um trabalho bastante cuidado que conta ainda com a participação de músicos credenciados cuja presença garante um bom suporte como banda, mais evidenciado nas quatro peças que não têm intervenção vocal, a que se junta a prestação da London Session Orchestra. A introdução das peças é sempre feita por Chris Botti permitindo depois que a música flua naturalmente sob o vigor de cada interpretação, acabando por intervir pontualmente e solando no momento próprio.
A primeira interpretação vocal cabe ao esplendor e firmeza da maturidade de Sting, que Botti acompanhou em anos anteriores. Segue-se um verdadeiro derreter de corações com Paula Cole a proporcionar uma doce interpretação para "My One And Only Love" enquanto o swing de Michael Bublé desperta o registo para uma dinâmica mais descontraída com "Let There Be Love", e a contemporaneidade do arranjo de Greg Phillinganes para "Good Morning Heartache" permite que Jill Scott tenha a prestação mais corrente desta edição. É ainda difícil de resistir à terna comoção de Paul Buchanan em "Are You Lonesome Tonight?", não sentir a majestosidade de Gladys Knight para "Lover Man" ou a dinâmica iteração entre a orquestra e a interpretação de Renee Olstead em "Pennies From Heaven". Resta a introdução de "Here's That Rainy Day" que parece algo deslocada da interpretação de Rosa Passos e o fecho do álbum com a sofrível interpretação de Steven Tyler, o Sr. Aerosmith, para "Smile". 
Entre as quatro peças instrumentais, há que referir um arranque adorável com "Embraceable You", a harmonia e a organização de "What's New?" e "I'll Be Seeing You" e o original "To Love Again" que apesar de ligeiramente distante da aura jazzística mais clássica que compõe o registo cumpre a sua posição no alinhamento.

sábado, 19 de dezembro de 2020

Please Please Me (Mono edition) - THE BEATLES


1 I Saw Her Standing There   2:53   
2 Misery   1:48
3 Anna (Go To Him) (A. Alexander)   2:55   
4 Chains (G. Goffin / C. King)   2:24
5 Boys (L. Dixon/ W. Farrell)   2:25   
6 Ask Me Why   2:25   
7 Please Please Me   2:01
8 Love Me Do   2:20
9 P.S. I Love You   2:03
10 Baby It's You (M. David / B. Williams / B. Bacharach)   2:35
11 Do You Want To Know A Secret   1:57
12 A Taste Of Honey (B. Scott / E. Marlow)   2:02
13 There's A Place   1:50   
14 Twist And Shout (P. Medley / B. Russell)   2:32   

"Please Please Me" foi editado em março de 1963 e fica registado para a história como o primeiro álbum longa duração dos Beatles. O êxito inesperado dos singles "Love Me Do", editado em outubro de 1962, e "Please Please Me", em janeiro de 1963, levou a que na capa desta edição surja a menção "Please Please Me with Love Me Do and 12 other songs"; descoberto e confirmado o potencial do quarteto de Liverpool, era altura de colocar a máquina comercial em funcionamento e tirar proveito do seu rendimento. 
Sob atenta supervisão de George Martin, numa sessão de um dia foram gravadas onze músicas das quais apenas não se aproveitou "Hold Me Tight" que seria regravada mais tarde para inclusão no alinhamento do álbum seguinte. O conteúdo integral dos dois singles anteriores foi também incluído no alinhamento desta edição e ficou assim composto o trabalho de estreia que viria a marcar uma época para a música britânica e consequentemente toda a história da música. 
A devoção europeia pela música norte americana encontra-se bem evidenciada nas seis versões que os Beatles gravaram para este registo, "Baby It's You" e "Boys" das Shirelles, "Chains" das Cookies, "Twist And Shout" dos Isley Brothers, "Anna (Go To Him)" de Arthur Alexander e a bela adaptação para "Taste Of Honey", instrumental de Herb Alpert para um musical Broadway que era por sua vez uma adaptação de uma peça de teatro britânica. Muitas destas músicas vinham do repertório que a banda utilizava regularmente ao vivo sendo igualmente significativa a inclusão de oito músicas originais, já então assinadas pela dupla McCartney/Lennon, e um claro voto de confiança no seu trabalho de composição. Não havia confiança era com os bateristas. Pete Best, o baterista original, foi afastado da formação poucos dias antes da assinatura do contrato com a EMI Parlophone porque George Martin considerava-o como o elemento mais fraco da formação e podia prejudicar o trabalho da banda. Para o seu lugar entrou de imediato Ringo Starr que foi logo confrontado com a gravação do primeiro single e teve ainda de suportar a chamada de um baterista profissional para o substituir nas gravações iniciais sendo no entanto as prestações de Ringo que figuram em todas as músicas deste registo. Os préstimos de Ringo Starr neste álbum passam também pela sua performance vocal em "Boys" enquanto George Harrison assume a voz para "Do You Want To Know A Secret". 
Músicas simples, curtas e eficazes, repletas de boa disposição adolescente e muito alento, plenas de rock'n roll atestado com a leveza de arranjos pop e boas harmonias vocais, preenchem os 32 minutos deste pequeno registo de estreia que no fundo se revelou tão importante para o futuro de toda a música pop/rock.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

Urban Cowboy - ORIGINAL SOUNDTRACK - LP02


 Lado B
1 Stand By Me - MICKEY GILLEY   3:35
2 Cherokee Fiddle - JOHNNY LEE   4:06
3 Could I Have This Dance - ANNE MURRAY   3:14
4 Lyin' Eyes - EAGLES   6:23
Lado C
1 Lookin' For Love - JOHNNY LEE   3:41
2 Don't It Make Ya Wanna Dance - BONNIE RAITT   3:29
3 The Devil Went Down To Georgia - CHARLIE DANIELS BAND   3:35
4 Here Comes The Hurt Again - MICKEY GILLEY   2:41
5 Orange Blossom Special / Hoedown - GILLEY'S "URBAN COWBOY" BAND   2:06 

O segundo disco desta dupla edição é composto pelos lados B e C e centra-se totalmente no country e nas suas derivações pop/rock. Poucos anos antes, o movimento outlaw quebrou os laços com a vertente mais tradicional da música country e atualizou o género criando uma nova abertura e estilo. Mais liberdade de composição e uma clara fusão com o domínio que o rock e a pop exerciam a nível geral, conduziram o country a uma nova fase a que o sucesso do filme "Urban Cowboy" e respetiva banda sonora não será alheio acabando por ajudar também ao reviver do género, agora mais exposto e renascido por uma veia mais comercial.
O enorme bar texano Gilley's Club, onde se centra a maior parte da ação do filme, era propriedade do músico country Mickey Gilley que conta com três aparições neste registo. A adaptação country para o clássico "Stand By Me" proporcionou-lhe o seu maior sucesso comercial, "Here Comes The Hurt Again" é uma balada com estilo e Gilley ainda fecha a banda sonora com a sua "Urban Cowboy" Band e o festivo instrumental "Orange Blossom Special / Hoedown" que nesse mesmo ano ganhou o grammy para a melhor interpretação instrumental countryOutra presença da casa era o cantor Johnny Lee, trabalhou com Mickey Gilley ao vivo e no clube, que consegue aqui o salto de carreira que procurava graças a "Lookin' For Love" e contribui ainda com "Cherokee Fiddle". A cantora canadiana Anne Murray representa uma ligação com alguma tradição, "Could I Have This Dance" é uma bonita balada que carrega algum classicismo, e um dos pontos altos da edição é o revisitar da irresistível beleza que é o country-rock de "Lyin Eyes", original de 1975 dos Eagles. Repetem-se ainda as presenças da sempre respeitável Bonnie Raitt e do country demoníaco da Charlie Daniels Band.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2020

Urban Cowboy - ORIGINAL SOUNDTRACK - LP01


 Lado A
1 Hello Texas - JIMMY BUFFET   2:33
2 All Night Long - JOE WALSH   3:50
3 Times Like These - DON FOGELBERG   3:02
4 Nine Tonight - BOB SEGER AND THE SILVER BULLET BAND   4:15  
Lado D
1 Love The World Away - KENNY ROGERS   3:11
2 Falling In Love For The Night - CHARLIE DANIELS BAND   3:00
3 Darlin' - BONNIE RAITT   2:34
4 Look What You've Done To Me - BOZ SCAGGS   5:00
5 Hearts Against The Wind - LINDA RONSTADT w/ J.D. SOUTHER   2:58  

Edição em formato vinil duplo que contêm a banda sonora original do filme Urban Cowboy, realizado por James Bridge em 1980. Para um filme tão específico cuja ação se desenrola maioritariamente dentro das instalações do enorme bar country Gilley's Club, que representa a intensidade com que se viveu este período único na zona do Texas e que acabou por dar origem a um novo movimento da música country, não seria de esperar outra abordagem musical senão a música norte americana mais enraizada neste ambiente. A banda sonora conta com a participação de vários autores de rock e de country o que transmite algum caráter de autenticidade ao enredo do filme e à partitura que o compõe. 
O lado A é completamente rock'n roll e arranca com o soalheiro "Hello Texas" a dar as boas vindas. Já sem os Eagles, Joe Walsh continua com a sua carreira a solo e contribui com "All Night Long" enquanto Dan Fogelberg empresta a sua frescura com "Times Like These" e Bob Seger e a sua Silver Bullet Band dispensam quaisquer apresentações. O lado D integra-se naturalmente no ambiente do filme e começa meloso através de "Love The World Away", uma das principais músicas da banda sonora, pela voz e presença de Kenny Rogers. A simpatia da Charlie Daniels Band apresenta-se com um country ligeiro, com toque mariachi, em "Falling In Love For The Night" a que se segue a presença sempre respeitável de Bonnie Raitt com a bonita melodia country "Darlin'". Boz Scaggs tem uma curiosa aparição com a serenidade de um momento pop/rock, co-escrito com David Foster, em que é acompanhado por elementos dos Toto, cabendo a Linda Ronstadt o fecho do álbum em dueto com J.D. Souther numa caraterística performance acústica.

quinta-feira, 26 de novembro de 2020

Force Majeure - TANGERINE DREAM

 

Side A
1 Force Majeure   18:18
Side B
1 Cloudburst Flight   7:21
2 Thru Metamorphic Rocks   14:15

Em Force Majeure, editado em 1979, o trio alemão Tangerine Dream prolonga o tempo no espaço e cria uma obra totalmente instrumental, de forte caráter progressivo, composta por três composições originais de Edgar Froese e Chris Franke que detêm a capacidade de gerar ambientes sedutores onde se formam extensas imagens sonoras. Os sintetizadores assumem a base desta obra a que se juntam, pontualmente, a bateria de Klaus Krieger, algumas guitarras, acústicas e elétricas, inseridas por Edgar Froese e um agradecimento especial à participação do engenheiro de som Eduard Meyer em violoncelo. É esta ligação de fatores que permite sustentar a dinâmica e organizada estrutura espacial que compõe a força dimensional das três composições. 
"Force Majeure", a peça homónima cuja dimensão ocupa todo o lado A da edição em vinil, revela-se notoriamente como o ponto central deste trabalho. O primeiro andamento inicia-se com uma introdução celestial que conduz a uma secção de maior vivacidade até atingir a harmonia do primeiro pico estrutural, interrompido por nova ambiência celestial. A peça retoma ordeiramente para uma nova dinâmica, evoluindo para a melodia primária que fecha o lado A.
"Cloudburst Flight" é a peça mais "curta" e acessível do registo. Manifesta-se como uma viagem enérgica que tem início no ambiente acolhedor de uma guitarra acústica envolta pela serenidade do ambiente criado pelos sintetizadores, evoluindo depois para o vigor de uma jornada que será acentuada pela energia da guitarra elétrica acabando por finalizar o seu percurso de forma bem tranquila.
"Thru Metamorphic Rocks" distingue-se como o momento mais particular da edição. Começa por apresentar algumas semelhanças com o vigor descrito na jornada da peça anterior mas a meio da composição é introduzido o pulsar de uma curiosa sequenciação, pronunciada como uma espécie de percussão eletrónica, rica em efeitos e a roçar algum experimentalismo, e que conduz à secção final desta obra.

quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Isolamento Acidental - VÁRIOS


1 Carta Do Panóptico - MORTE PSÍQUICA   5:58
2 Dor Estranha - DESOLATE MAN   4:27
3 Libera Nos A Malo - ODE FILÍPICA (feat. IZALAH)   4:07
4 Isso Lamento - TERMINAL TERMINAL   5:44
5 Foi Sempre Por Amor - LISBOA NEGRA   4:01   
6 Cold Night - HONORATA   5:23
7 Quero Estar Contigo On-Line - MIND RESET   4:05
8 Rotina - ERROS ALTERNADOS   4:21
9 Pandemia - THE DREAMS NEVER END   4:31
10 China - D#K   5:01
11 Perseguição - HERR G meets FUEL2FIGHT   4:16
12 Não Consigo Respirar - JH LAB   5:46
13 Dry Mouth - LUX YURI   4:34
14 Ed Kemper Lockdown 2.0 - FASHION BIZARRE   3:28
15 Welcome To The New Normal - TEATRO GROTESCO   6:31

A Anti-Demos-Cracia (ADC) é uma pequena editora portuguesa independente que foi criada em 1988 com o intuito de "registar em cassetes as deambulações sonoras do projecto Industrial-Alternativo VARPLES PRAVLES". A editora renasceu em 2008 tendo agora como objetivo a edição e divulgação de projetos portugueses da cena alternativa, em formato cd ou digital, e conta atualmente com "cerca de 60 bandas portuguesas e estrangeiras" no seu catálogo. A ADC cumpre a sua determinação com consciência de que o faz "para uma minoria" o que torna este tipo de trabalho em algo muito especial e próprio. Não se trata de uma questão de elitismo mas sim de música contra-corrente que sobrevive num circuito de música que se quer de culto e não chega a todos mas encontra-se aberto a quem quiser conhecer e há muito por onde explorar. 
A compilação "Isolamento Acidental" nasce do desafio lançado pela ADC "a alguns projetos da cena alternativa portuguesa, em que a música de cada projeto reflete, ou é inspirada, ou é relacionada, com o isolamento ou confinamento, a que cada um esteve sujeito, derivado à pandemia". Não são projetos convencionais, cada um manipula a sua própria estética e assume-a prontamente, podem até não conter o primor de uma produção elaborada que torne as suas músicas mais atrativas, mas revelam-se genuínos, criativos e bastante originais, evidenciando o papel preponderante da arte da interpretação e demonstrando uma criatividade musical bastante rica, focada na exploração de diversas sonoridades. 
O registo abre com MORTE PSÍQUICA e aquela que será a música mais "completa" desta edição, enquanto DESOLATE MAN assume a herança de uma saudosa sonoridade da então denominada Música Moderna Portuguesa da segunda metade da década de 80 e se aqui juntarmos o rock saturado de LUX YURI temos os únicos projetos desta compilação que utilizam guitarras. A inteligente e deliciosa synthpop de LISBOA NEGRA e THE DREAMS NEVER END, a que se poderá juntar a comovente expressividade cinéfila de HONORATA (tão OMD) e a "perturbante" presteza eletrónica de HERR G MEETS FUEL2FIGHT, são os nomes que aqui elevam os valores da música eletrónica. Depois há momentos como a curiosa insanidade da cuidada prece de ODE FÍLIPICA, a terrível conjetura do pulsar cardíaco de TERMINAL TERMINAL, a pluralidade sonora do projeto MIND RESET, a resignada declamação de ERROS ALTERNADOS, a vertente mais experimental do confronto intercontinental de D#K, o claustrofóbico e aflitivo JH LAB, a prevenção automatizada de FASHION BIZARRE e o obscuro manto negro do TEATRO GROTESCO, projetos que evidenciam alguma singularidade.
Para uma minoria, "Isolamento Acidental" permanecerá certamente como um testemunho sombrio, ou uma banda sonora perfeita, de uma etapa invulgar nas vidas das atuais gerações. 

A Anti-Demos-Cracia pode ser consultada através do seguinte link https://antidemoscracia.wixsite.com/a-d-c ou em https://anti-demos-cracia.bandcamp.com/

*citações em ítálico retiradas da página oficial on-line da ADC e do panfleto promocional da edição.

terça-feira, 10 de novembro de 2020

Tales From Topographic Oceans - YES - LP02


 
Side A
1 The Ancient: Giants Under The Sun   18:45   
Side B
1 Ritual: Nous Sommes Du Soleil   21:52   

O segundo disco confirma a compleição e plenitude das peças que constituem a totalidade deste trabalho. Uma obra grandiosa que pode ser interpretada como um desafio a que a banda britânica se propôs e uma clara evidência de que o rock progressivo se tinha tornado demasiado grande; a dimensão das peças obrigava a uma arriscada e ambiciosa dupla edição em vinil com apenas quatro músicas. Os Yes não vacilaram perante as limitações do que seria considerado tolerável para uma edição discográfica e foi da melhor forma que concluíram esta obra notável, digna de registo e uma referência para o futuro do género. 
Composições mais complexas, centradas no detalhe dos arranjos da instrumentação, complementam a dinâmica do registo e levam a que Jon Anderson surja agora pontualmente em apenas algumas secções, nomeadamente em "The Ancient", o terceiro movimento (puranas). Uma peça bastante abstrata, muito pormenorizada e arriscada, de teor algo experimentalista, totalmente dominada e moldada pelas investidas elétricas do guitarrista Steve Howe que conclui com uma surpreendente e admirável execução acústica em guitarra clássica. A obra fecha com "Ritual", o quarto andamento (tantras), em jeito de celebração ou de uma afirmação (nous sommes du soleil). É uma peça bastante espiritual, que reforça o caráter concetual que envolve este trabalho, e expressa-se pela satisfação e dinamismo dos vários movimentos que a compõe com relevância para a exultada explosão rítmica que ocupa o início da segunda metade desta composição. 
Curiosidades; este é o primeiro trabalho dos Yes sem o baterista Bill Brufford, pertencente à formação original, que foi substituído por Alan White. A exaustão/desilusão deste tipo de trabalho viria a deixar nova ferida com Rick Wakeman a abandonar os Yes após a conclusão deste álbum para se dedicar ao seu trabalho a solo.

terça-feira, 3 de novembro de 2020

Tales From Topographic Oceans - YES - LP01

 


Side A
1 The Revealing Science Of God: Dance Of The Dawn   20:37 
Side B
1 The Remembering: High The Memory   20:46   

À escala do rock convencional, Tales From Topographic Oceans é um monstro. Um registo épico cuja grandiosidade reside na longa estrutura que compõe a totalidade das quatro peças originais incluídas nesta obra dupla, editada em 1973, que para muitos representa o limite do rock progressivo; o excesso de um estilo cuja megalomania conduziu a peças extremas em que cada um dos lados do disco da edição original em vinil contém apenas uma música, com uma duração média de vinte minutos por faixa. A ambição dos Yes vinha a crescer de álbum para álbum e Jon Anderson percebeu que tinha encontrado a base perfeita para este trabalho enquanto lia o livro "Autobiografia de um Iogue" de Paramahansa Yogananda e deparou com as notas de rodapé da página 83 nas quais se descreviam as quatro regras (shastras) que sustentam a religião hindu. Simultaneamente causador de tanta paixão e controvérsia, o álbum foi desenvolvido pelo vocalista Jon Anderson em parceria com o guitarrista Steve Howe enquanto a restante banda contribuiria depois com a sua parte em estúdio. Concluído como uma obra maior, um registo duplo, pleno de ambição e metafísica, composto por quatro longas e meditativas suites, conduzidas pelos textos de Jon Anderson que dedica uma doutrina (shastra) a cada um dos lados do disco, não é um disco para se meter a tocar e deixar correr. É para se ouvir atentamente e experimentar a viagem que Jon Anderson e os Yes propõem. 
O primeiro andamento (shrutis) fundamenta-se na revelação espiritual sob o despertar da alvorada e preenche o lado A do primeiro disco. A interpretação de Jon Anderson domina a maior parte desta peça, com uma introdução vocal bastante interessante que lidera o crescendo que conduz ao início da jornada. A peça flui naturalmente, sem grandes devaneios, passando pelas habituais dinâmicas e segura pela estabilidade e experiência dos Yes para com este tipo de composição. O segundo andamento (suritis) invoca as recordações e a importância da memória, ou uma viagem à experiência do que se aprendeu no passado para se utilizar de forma significativa no presente. Uma peça mais linear e refletiva em que o teclista Rick Wakeman tem a função de criar as camadas atmosféricas necessárias para proporcionar o ambiente que induz os momentos meditativos que interrompem a dinâmica inicial e a voltam a lançar no seu espaço ordenado. Fecha assim a primeira parte desta obra tão delicada.

segunda-feira, 26 de outubro de 2020

Life - SIMPLY RED


1 You Make Me Believe   3:51
2 So Many People   5:19
3 Lives And Loves   3:21
4 Fairground   5:33
5 Never Never Love   4:19
6 So Beautiful   4:58
7 Hillside Avenue   4:45
8 Remembering The First Time   4:43
9 Out On The Range   6:00
10 We're In This Together   4:14  

Depois de Stars em 1991, os britânicos Simply Red voltavam a mostrar vida em 1995 com Life. Um trabalho adulto e distinto que cumpre os habituais padrões qualitativos dos trabalhos anteriores dos Simply Red e que compõem a importância da soul britânica contemporânea, com um leve aroma pop e jazzMick Hucknall mantém a liderança da banda que formou em 1984 e aproveita a sequência das três primeiras músicas para arrasar logo de início espalhando o seu charme e classe, caraterísticas que conserva ao longo de todo o registo apesar da inclusão de três músicas distintas que ameaçam a perda de alguma identidade mas conclui-se que a sua inclusão é perfeita e eficaz e transmite alguma diversidade a este trabalho; "Fairground" é dominada pela ambiência latina da batucada (um sampler da música "Give It Up" dos The Goodmen, que por sua vez utilizaram um sampler de "Fanfarra" de Sérgio Mendes) e promove uma inquieta vontade de dançar. Foi o single que serviu de apresentação ao álbum e cometeu a proeza de ser o primeiro single da banda a alcançar o primeiro lugar no top UK. "Hillside Avenue" explora o terreno do reggae. Nos créditos estão mencionados os nomes de Sly Dunbar e Robbie Shakespeare, bateria e baixo respetivamente, sem especificar em que músicas participam. Sendo a dupla bem conhecida pelas suas lendárias prestações no género só podem estar mesmo aqui. Um bom enquadramento de estilos que resulta noutro momento pulsante. "We´re In This Together" é a música que encerra o álbum e move-se numa área mais espiritual com a participação do grupo coral Umoja Singers Chorale. Esta música viria a ser escolhida no ano seguinte, pela UEFA, como a música oficial do Euro 96. O restante trabalho move-se na dinâmica habitual dos Simply Red e depois da delícia da já mencionada sequência inicial surge ainda a cálida "Never Never Love", a inquestionável formosura de "So Beautiful", a incontornável "Remembering The First Time" e o odor funky de "Out On The Range". Há realmente vida neste trabalho.

domingo, 18 de outubro de 2020

Under The Iron Sea - KEANE


1 Atlantic   4:12
2 Is It Any Wonder?   3:05
3 Nothing In My Way   3:58
4 Leaving So Soon?   3:58
5 A Bad Dream   5:02
6 Hamburg Song   4:36
7 Put It Behind You   3:36   
8 Crystal Ball   3:52   
9 Try Again   4:26
10 Broken Toy   6:06         
11 The Frog Prince   4:20

Em Under The Iron Sea, o segundo trabalho de estúdio para os britânicos Keane, editado em 2006, a nobreza das canções pop permanece altiva numa formação que continua a não incluir guitarras mas que teve aqui o arrojo de puxar um pouco mais pelos décibeis. O registo encontra-se afligido por uma ligeira excitação de volumes o que cria uma leve distorção, bastante evidenciada no single "Is It Any Wonder?" cujo efeito de piano distorcido ameaça um riff de guitarra e cria uma dinâmica mais rock do que pop, que se mantêm ativa ao longo do registo. Provavelmente, fruto de uma ideia pré-concebida para compensar a falta de enchimento de outros instrumentos que não existem ou mesmo uma tentativa de aproximação a uma sonoridade mais próxima do rock, mas trata-se de um recurso desnecessário porque as músicas são bastante ricas em harmonia e é por isso que funcionam tão bem. Numa banda em que a voz é sustentada essencialmente por um piano e por uma bateria, os Keane continuam a possuir a capacidade de criar canções bonitas, plenas de harmonia pop, e têm na voz de Tom Chaplin um enorme ponto de honra; a vontade que dá de cantar com ele mas não esquecer que é o pianista Tim Rice-Oxley quem assume o trabalho de escrita e composição e grava inclusive os baixos. 
Under The Iron Sea esconde-se por trás de um reino de fantasia cuja aurora se dá com os cautelosos acordes de "Atlantic", ou o despertar de um sonho, mas tudo se solta logo de seguida com a energia de "Is It Any Wonder?". A pureza e cristalinidade pop com que os Keane deliciaram as audiências no primeiro álbum surge bem destacada em "Nothing In My Way" seguindo-se depois um registo ligeiramente diferente em "Leaving So Soon?" com alguma maturidade sonora e um dos momentos mais moderados deste trabalho. "Bad Dream" é um momento emotivo e arrepiante, outra das maravilhas de harmonização, e leva airosamente até "Hamburg Song" uma música apenas para voz e teclados que soa quase como um exercício a solo, fica mesmo a ideia que Tom Chaplin a poderia cantar sozinho sem qualquer acompanhamento. Em "Put It Behind You" volta a sentir-se o álbum mais próximo da dinâmica rock e encerra-se aqui um capítulo. A candura de "Crystal Ball" transmite um enfâse extraordinário e marca uma transposição no álbum, acentuada pelo efeito dramático de uma intro de quase 3 minutos, feita em contagem decrescente, para a idade da inocência deste registo. A calma e ponderação de "Try Again" interpõe-se para dar depois lugar à curiosa aproximação da sonoridade dos Radiohead em "Broken Toy" e é de forma mágica, no reino da fantasia, que o álbum encerra com "The Frog Prince".

quinta-feira, 8 de outubro de 2020

The Grand Wazoo - FRANK ZAPPA/THE MOTHERS

 

1 The Grand Wazoo   13:19
2 For Calvin (And His Next Two Hitch-Hikers)   6:06
3 Cletus Awreetus-Awrightus   2:57
4 Eat That Question   6:42
5 Blessed Relief   7:59

1972 foi o ano em que Frank Zappa cumpriu um período de convalescença em casa como consequência de uma queda de palco que lhe valeu uma perna partida. Neste mesmo ano a formação que Zappa manteve como Mothers separou-se mas houve ainda oportunidade para a edição de dois trabalhos em tudo similares mas com diferentes atributos. Waka/Jawaka foi editado em Julho, apenas em nome próprio, enquanto que este Grand Wazoo saiu em dezembro desse mesmo ano e foi creditado aos Mothers. Ambos os trabalhos foram praticamente gravados pela mesma formação onde se incluem alguns membros dos Mothers. Grand Wazoo começa por recuperar a personagem lunática Uncle Meat, cujas experiências alucinantes servem de mote à estrutura composicional desta obra manifestamente embrenhada no jazzO formato big band domina a primeira parte do registo cujas composições evidenciam o toque mágico da peculiar e inventiva orquestração de Zappa, imponente em "Grand Wazoo" e de caráter mais experimental em "For Calvin", tendo depois em "Cleetus Awreetus-Awrightus" uma espécie de bem-humorada transposição da parte um para a parte dois e o mais perto que por aqui se chega do formato de uma "canção". Coube a George Duke as honras de abertura para a segunda parte deste trabalho e a sua enorme presença nas teclas é bem sentida nas próximas composições. A formação é agora mais reduzida, a secção de sopros diminuiu, mas Frank Zappa consegue manter o elevado nível musical das suas peças, com "Eat That Question" a roçar o campo do rock, dentro de uma fusão de géneros ao seu melhor estilo, enquanto "Blessed Relief" é uma espécie de descompressão que encerra o álbum como uma peça comedida, plena de requinte jazz e muito bom gosto. É sabido que Frank Zappa soube sempre tirar o melhor partido dos músicos com que trabalhou e desta formação exemplar salienta-se logo de início a cumplicidade da poderosa secção rítmica composta por Ainsley Dunbar na bateria e "Erroneous" no baixo, que se sabe agora ser o baixista Alex Dmochowski. Como solistas neste registo apresentam-se, Sal Marquez no trompete, Bill Byers e Ken Shroyer nos trombones, Ernie Watts contribui com um pequeno solo de saxofone para "Cleetus Awreetus-Awrightus", Tony Duran na guitarra, nova referência para George Duke e um Frank Zappa exímio com destaque nos seus solos de guitarra. 

segunda-feira, 28 de setembro de 2020

Live Tokyo '85 - PAT METHENY GROUP


1 Forward March   4:00   
2 First Circle   10:51   
3 Scrap Metal   9:21
4 Straight On Red   8:42   
5 Are You Going With Me?   9:46   
6 Half Life Of Absolution   13:14
7 Letter From Home   2:40
8 Yolanda, You Learn   10:55    

Bootleg (edição não oficial) correspondente a uma transmissão de radio japonesa aquando de um concerto do Pat Metheny Group no Gotanda U-Port Hall, Tokyo, Japão, no dia 9 de outubro de 1985. É conhecido o legítimo aborrecimento que este tipo de trabalho causa a Pat Metheny pois trata-se de utilização indevida do seu património cultural e para além disso o guitarrista norte americano gosta de ter controle sobre as suas edições de forma a poder garantir uma boa prestação técnica e a melhor qualidade de som ao ouvinte. Para os fãs e colecionadores, o bootleg desperta o fascínio de poderem aceder a material inédito do seu ídolo ao qual nunca chegariam de outra forma. Neste caso, a gravação até apresenta uma qualidade sonora bastante aceitável. O reportório desta data começa por se centrar no álbum First Circle, editado no ano anterior, mas o pormenor mais interessante desta gravação, para além da excelência da atuação, acaba por ser a inclusão de quatro peças inéditas que nunca passaram do palco para um disco de estúdio, exceção para "Letter From Home" que viria a integrar o álbum do mesmo nome em 1989. 
"Forward March" serve a introdução da banda, com a música a ser interrompida a meio pela locução do radialista, totalmente em japonês, para apresentação da respetiva emissão. "First Circle" desenrola-se de forma maravilhosa dando depois lugar a um dos momentos mais soltos da atuação. "Scrap Metal" é um momento ímpar, uma espécie de exercício livre de improvisação que a banda utilizou ao vivo durante alguns anos, em que Pat Metheny tira partido das capacidades da sua guitarra sintetizada criando uma ambiência sonora com reminiscências de Ornette Coleman, um dos seus grandes ídolos, com quem viria a gravar poucos meses depois desta atuação. "Straight On Red" é outra peça inédita, habitué dos concertos deste altura, e é um show de percussão e ritmo com ambiência latina que foi tocada ao vivo com regularidade ainda durante alguns anos sem nunca passar para o estúdio. Percebe-se, pela reação do público, que "Are You Going With Me?" era já na altura um dos momentos mais esperados da atuação seguindo-se-lhe mais dois momentos inéditos com "Half Life Of Absolution" e "Letter From Home". Na primeira apresentação da banda, após "First Circle", Pat Metheny menciona que a banda irá tocar algum repertório mais antigo e que haverá ainda lugar para uma nova música que foi composta nesta altura, enquanto estavam no Japão. Segundo revelações posteriores de Pat Metheny, "Half Life Of Absolution" terá sido criada em backstage, neste mesmo ano, para integrar um gig com o trompetista Japonês Tiger Okoshi, sendo depois tentada uma adaptação da música ao Pat Metheny Group. Será "Half Life Of Absolution" a referida música na apresentação? A gravação encerra com "Yolanda, You Learn" e nova intervenção do locutor. Documento interessante para coleção.

Agradecimento especial ao José Luís Carvalho pela revisão de texto

terça-feira, 22 de setembro de 2020

Mirrored - BATTLES


1 Race: In   4:50
2 Atlas   7:07
3 Ddiamondd   2:33
4 Tonto   7:43
5 Leyendecker   2:48
6 Rainbow   8:11
7 Bad Trails   5:18
8 Prismism   0:52
9 Snare Hangar   1:58
10 Tij   7:03
11 Race: Out   3:29   

Registo de estreia ambicioso para os nova-iorquinos Battles, em 2007, "Mirrored" é uma peça de trabalho complexa e ousada que procura escapar, de alguma forma, às garras do convencionalismo. O registo distingue-se pelo domínio do forte caráter progressivo e bastante experimental das onze peças que o compõem, um claro desafio de tentar criar algo que não tenha já sido feito mas - como inovar quando praticamente já tudo foi feito ou, pelo menos, tentado? Os Battles apresentam-se como uma formação de rock convencional com guitarras, teclados, voz, baixo e bateria, e vão precisar de muito mais que isto para serem realmente inovadores. Começam por conseguir marcar o seu terreno, mostrando-se bem sucedidos na tentativa de criar uma identidade própria através da inteligente manipulação dos efeitos à sua disposição. As peças são essencialmente instrumentais, as vozes, mesmo quando não estão processadas, acabam por encaixar de forma curta e pontual na estrutura das músicas, que apresentam a dinâmica habitual de uma banda de rock atual, salientando-se o "abuso" da exploração da maquinaria e efeitos para marcar a tão almejada diferença. Deformação de sons, utilização sucessiva de camadas e camadas de loops, alterações tonais, mas no entanto...o ritmo será sempre ritmo e ritmicamente falando este trabalho é bastante poderoso (com a particularidade da bateria ser mesmo o único instrumento deste registo que não sofre qualquer manipulação de efeitos). É percetível alguma qualidade técnica através da execução e da complexidade e originalidade das peças que compõem o registo ... ou uma clara demonstração da boa veia criativa desta formação. 

terça-feira, 15 de setembro de 2020

3 Feet High And Rising - DE LA SOUL

 


1 Intro   1:41
2 The Magic Number   3:14
3 Change In Speak   2:32
4 Cool Breeze On The Rocks   0:47
5 Can U Keep A Secret   1:40
6 Jennifa Taught Me (Derwin's Revenge)   3:23
7 Ghetto Thang   3:34
8 Transmitting Live From Mars   1:11
9 Eye Know   4:12
10 Take It Off   1:52
11 A Little Bit Of Soap   0:56
12 Tread Water   3:44
13 Potholes In My Lawn   3:47
14 Say No Go   4:19
15 Do As De La Does   2:11
16 Plug Tunin' (Last Chance To Comprehend)   4:06
17 De La Orgee   1:12
18 Buddy   4:54
19 Description   1:30
20 Me Myself And I   3:49
21 This Is A Recording 4 Living In A Full Time Era (L.IF.E.)   3:09
22 I Can Do Anything (Delacratic)   0:40
23 D.A.I.S.Y. Age   4:41
24 Plug Tunin' (Original 12" Version)   3:42

Em 1989 os norte americanos De La Soul editavam "3 Feet High and Rising", o seu primeiro registo discográfico, e logo marcaram a sua posição no terreno do hip-hop. A boa disposição dos três rappers, Posdnuos, Trugoy The Dove e Pasemaster Mase, contou com o forte apoio de Prince Paul na produção deste trabalho que acaba por se revelar como uma espécie de flower power do hip-hop ou a sua daisy age, que os De La Soul tanto apregoam ao logo do registo. Um trabalho colorido, descontraído e divertido, com uma paleta preenchida por referências que atuam sob a mestria da arte de bem samplar, empregue aqui na sua melhor forma de criatividade, composição e colagem. Um dos grandes factores de interesse do registo é mesmo a quantidade de samples utilizados (facto que iria gerar grandes controvérsias nos anos seguintes) mas cujo recurso permite a recuperação de repertório já esquecido ou até ignorado. O rap é debitado em doses rápidas sendo intercalado por alguns apontamentos curiosos onde se incluem um concurso com perguntas impossíveis de responder, uma lição de francês, a higiene pessoal e uma excitante orgia. A originalidade da lírica utilizada pelos De La Soul permite a versatilidade das temáticas abordadas tornando-se este outro ponto de interesse para o trabalho inteligente do trio; comparando com a intensidade da intervenção corrosiva dos contemporâneos Public Enemy, neste registo não se abordam questões políticas ou pretensos alarmismos sociais enveredando antes por um contexto mais ligeiro, muito pop, mas bastante sarcástico.

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

Phantom Navigator - WAYNE SHORTER


1 Condition Red   5:12
2 Mahogany Bird   6:12
3 Remote Control   7:57
4 Yamanja   6:30
5 Forbidden, Plan-It   6:10
6 Flagships   6:39    

Em 1987, um ano depois da edição do último trabalho de estúdio dos Weather Report, o histórico saxofonista norte americano Wayne Shorter surge num contexto atualizado e rejuvenescido, com o registo "Phantom Navigator". Um álbum composto por seis peças originais, de sua autoria, em que se sente a forte ambiência maquinal do estúdio, onde proliferam as baterias programadas e os sintetizadores. Wayne Shorter não parece intimidado pela útil capacidade destas novas tecnologias e utiliza esse potencial em seu proveito com o apoio de uma nova geração de músicos que então se começava a afirmar. O domínio da sonoridade eletrónica sugere algumas nuances pop/rock (as composições vão bem para além disso) e afasta os apreciadores de jazz mais puristas mas é realmente o exímio trabalho de solista de Wayne Shorter, dividido entre os saxofones soprano e tenor, que sobressai num registo que apesar de tão maquinal é muito humano. Honras de abertura para "Condition Red", a marcar logo uma forte posição com um pulsar excitante e uma entusiasmante prestação de Wayne Shorter que aqui se diverte ainda com alguma vocalização scat"Mahogany Bird" destaca-se como a peça mais acústica do registo, conta com as notórias prestações de Chick Corea, em piano acústico, e de John Patituci e Gary Willis, respetivamente em baixo acústico e elétrico, e juntamente com "Remote Control", em que aparece Alphonso Johnson no baixo, são as peças em que é possível sentir ainda alguma da orgânica estrutural dos Weather Report. As três peças finais vivem três momentos diferentes; o exotismo de "Yamanja" é enriquecido por uma forte componente rítmica e pela prestação de Mitchel Forman nas teclas enquanto o desenho melódico de "Forbiden Plan-It" cria o momento mais cativante e mais dançante deste trabalho. E se este registo teve um início excitante, acaba por encerrar algo meditativo através das vozes fantasmagóricas de "Flagships". Cenário ideal para uma temática etérea, a funcionar sobre alguma complexidade rítmica, e aqui não se pode descurar o efeito que a ficção científica têm sobre Wayne Shorter. A sua paixão pelo género, desde a adolescência, é um facto conhecido e aqui notoriamente revelado por alguns dos títulos atribuídos às peças que compõem o alinhamento deste álbum. Não hesito por isso em considerar que Gustav Holst possa ter exercido alguma influência "mística". O último movimento da sua bem conhecida composição "Os Planetas", escrita entre os anos 1914-1916, é associada ao planeta Neptuno - O Místico e termina igualmente com um coro de vozes ambiental algo similar ao utilizado aqui, num contexto diferente, por Wayne Shorter. Sintonia celestial? Belíssimo trabalho de Wayne Shorter.

sábado, 29 de agosto de 2020

Misleading - MISLEADING


1 Gone   8:32   
2 Bitter Hit Blues   8:17
3 Karmemoto   11:27
4 Portal Visions   10:54
5 Return Loop   9:32   
6 Drop Out (Bónus)   7:28

De origem Nabantina, os Misleading são um power trio português, sem voz, oculto por uma cortina sónica que se manifesta sob o peso de uma atmosfera carregada em que o vigor e a intensidade de peças longas e arrastadas proporcionam viagens por atmosferas alienadas e a saturação predomina o ruído estabelecendo um cenário com tanto de poderoso como de hipnótico. Bem-vindo ao reino do psychedelic doom. A fórmula é usada exaustivamente mas apesar de repetitiva detêm a capacidade de prender a atenção através do poder da sua envolvência, totalmente instrumental, e do seu obscurantismo. É isto que os Misleading se propõem a oferecer no seu álbum de estreia; o balanço de uma viagem estimulante que mesmo não sendo totalmente alucinogénia é deveras estonteante e sincera. As faixas foram gravadas em 2019 e a edição em formato cd, limitada a 100 exemplares, é de 2020 e inclui um bónus, "Drop Out" é uma gravação/demo de um ensaio da banda. Os Misleading podem ser encontrados no bandcamp através do endereço  https://heavymisleading.bandcamp.com/

domingo, 23 de agosto de 2020

Metamorphosis - MAGENTA


1 The Ballad Of Samuel Layne   20:17
2 Prekestolen   3:43
3 Metamorphosis   23:15
4 Blind Faith   6:01

O projeto Magenta foi criado pelo teclista e compositor Robert Reed em 2001 e assenta as suas bases no rock progressivo mais clássico de predominância britânica. Metamorphosis foi editado em 2008, sendo o quarto trabalho original de estúdio deste coletivo de origem Galesa, mas apesar da demonstração de capacidade e ambição em manter a fidelidade a um estilo que continua a ser empolgante e apaixonante, o registo não atinge a mestria das clássicas referências que surgem dispostas ao longo de todo o disco e apesar das boas ideias dificilmente entusiasma o ouvinte mais experiente. Ficam-se por uma boa, mas humilde, prestação em que falta, principalmente, emotividade vocal. A voz doce e angelical de Christina Booth não consegue, aqui, transmitir a expressividade que a dinâmica do género exige. 
A edição é dominada por duas peças longas, em que cada uma excede os vinte minutos, com a sua complexidade de andamentos e detalhes, cumprindo com as habituais dinâmicas que identificam o estilo mais épico que compõe as peças mais longas, e estão carregadas de referências bastante óbvias à sonoridade dos Pink Floyd e dos Yes, sendo também percetível a influência do folk de Mike Oldfield. Esta sonoridade é atualizada por algumas passagens de caráter mais "pesado" que atestam a contemporaneidade do projeto. As músicas restantes são mais curtas e lineares; "Prekestolen" apresenta uma estrutura de caraterística folk enquanto "Blind Faith" mostra um lado mais rock mas contido. 
A edição posterior inclui extras e um dvd com uma versão audio para 5.1, making of, entrevistas e vídeos.

domingo, 16 de agosto de 2020

Hail To The Thief - RADIOHEAD


1 2+2=5 (The Lukewarm.)   3:19   
2 Sit Down. Stand Up (Snakes & Ladders.)   4:19  
3 Sail To The Moon (Brush the Cobwebs out of the Sky.)   4:17
4 Backdrifts (Honeymoon is Over.)   5:22
5 Go To Sleep (Little Man being Erased.)   3:20
6 Where I End And You Begin (The Sky is Falling in.)   4:28
7 We Suck Young Blood (Your Time is up.)   4:56
8 The Gloaming (Softly Open our Mouths in the Cold.)   3:31
9  There There (The Boney King of Nowhere.)   5:21
10 I Will (No man's Land.)   1:59   
11 A Punchup At A Wedding (No no no no no no no no.)   4:56   
12 Myxomatosis (Judge, Jury & Executioner.)   3:51
13 Scatterbrain (As Dead as Leaves.)   3:20
14 A Wolf At The Door (It Girl. Rag Doll.)   3:21    

Em 2003 os britânicos Radiohead editavam Hail To The Thief, o sexto registo original feito em estúdio. Mantêm-se o enigmático experimentalismo pop, aqui preenchido com algumas intervenções mais harmoniosas e linhas de guitarra bem intercaladas com a maquinaria eletrónica mas ainda assim não é uma peça de fácil digestão e requer alguma adesão até se começar a encaixar no seu enredo. No fundo, funciona como um mapa à espera de ser bem interpretado cujos percursos podem ser tortuosos ou terminarem num paraíso surpreendentemente perdido no final de uma esquina ou até mesmo na lua. A cada nova audição as paisagens surgem renovadas e arrastam o ouvinte para abismos profundos, outras vezes criam efeitos etéreos ou então surpreendem pela dinâmica da acção, ou pelo colorido do momento. A boa sensibilidade da complexidade pop de "Go To Sleep", "Where I End And You Begin" e "A Punchup At A Wedding" combina com os momentos maquinais de "Backdrifts" e "The Gloaming", e equilibra-se com a tímidez da naturalidade estrutural de "Sail To The Moon", "We Suck Young Blood" e "Scatterbrain". O registo acaba por explodir na crescente intensidade rock de momentos como "2+2=5", "Sit Down. Stand Up", "There There", "Myxomatosis" e "A Wolf At The Door", um manifesto despertar de sentidos nos extremos do disco. "I Will" acaba por ser apenas um pequeno apontamento. Este é também um trabalho que envolve jogos de palavras, a capa encontra-se ilustrada com uma imensidão delas, e títulos duplicados para uma interpretação mais completa e justa, à semelhança dos velhos cartazes Vitorianos que então anunciavam as peças musicais que iriam ser tocadas nas salas de música. 
Um registo singular e completo. 

sábado, 8 de agosto de 2020

Strong Arm Of The Law - SAXON


Side A
1 Heavy Metal Thunder   4:16
2 To Hell And Back Again   4:40
3 Strong Arm Of The Law   4:34
4 Taking Your Chances   4:13 
Side B
1 20,000 Ft   3:44
2 Hungry Years   4:46
3 Sixth Form Girls   4:16
4 Dallas 1 PM   6:25

Os britânicos Saxon foram uma das bandas mais importantes do período quente do movimento New Wave Of British Heavy Metal, a par dos Iron Maiden e Def Leppard. Enquanto os Iron Maiden e os Def Leppard conseguiram atingir carreiras impactantes, os Saxon mantiveram um percurso ativo mas mais discreto.
Strong Arm Of The Law foi editado em novembro de 1980, apenas seis meses depois de Wheels Of Steel, o seu segundo registo, e testemunha um bom período dos Saxon. No ano anterior tinham feito a digressão britânica com os Motorhead e percebe-se aqui a influência desse tempo na estrada com Lemmy e companhia. O registo abre como uma afirmação de postura do "novo género" através de "Heavy Metal Thunder", título certamente emprestado de um dos versos de "Born To Be Wild" dos Steppenwolf, e manifesta-se logo como uma estrutura sólida e consistente, célere e dinâmica, em que os guitarristas Graham Oliver e Paul Quinn se evidenciam pela sua destreza e pelo equilíbrio na combinação dos solos. Estas caraterísticas são constantes ao longo de todo o registo. A velocidade é o primeiro indício de que os Saxon vinham de facto com energia para destilar e impressionar e "To Hell And Back Again" confirma a tendência mas apresenta-se mais acessível e harmoniosa enquanto "Strong Arm Of The Law" desacelera um pouco, para um ritmo mais hard rock. "Taking Your Chances" e "20,000 Ft" recuperam o ritmo inicial, com direito a bombo duplo para esta última, "Hungry Years" revela-se mais lenta e balanceada mas mantêm-se consistente e "Sixth Form Girls" é apenas atrevida, com um refrão "simpático". "Dallas 1 PM" é a música que fecha o registo e que apresenta a estrutura mais completa, mesmo sem ser arrasadora contêm os elementos essenciais para cativar o ouvinte. Strong Arm Of The Law é de facto uma das peças fundamentais na afirmação do Heavy Metal britânico.

sexta-feira, 31 de julho de 2020

Positive Touch - THE UNDERTONES


Side A
1 Fascination   2:17
2 Julie Ocean   1:44
3 Life's Too Easy   2:27
4 Crisis Of Mine   2:21   
5 You're Welcome   2:41
6 His Goodlooking Girlfriend   3:02
7 The Positive Touch   2:14
Side B
1 When Saturday Comes   2:46
2 It's Going To Happen   3:32
3 Sigh & Explode   2:42
4 I Don't Know   2:35
5 Hannah Doot   2:47
6 Boy Wonder   2:02
7 Forever Paradise   3:01

Editado em 1981, "Positive Touch" foi o terceiro registo oficial para os norte irlandeses The Undertones que assim disponibilizavam mais um trabalho destemido e dinâmico, preenchido com boa disposição e um vasto leque de pequenas canções rock/pop/new wave elaboradas com detalhe. Uma obra cativante que prende o ouvinte pelo rol de boas canções que a compõe e evidenciam a unidade de um registo maturo e coerente, dominado pela riqueza e pelo pormenor de uma pop curta e criativa, longe de se tornar repetitivo e fatigante. À medida que se aprofunda o registo, mais viciante se torna a sua audição. A peculiaridade do timbre vocal de Feargal Sharkey continua a ser um ponto forte na distinção do trabalho da banda mas não se pode descurar a qualidade e a forma como os restantes elementos se enquadram na importância do resultado final desta obra. A combinação das guitarras é sedutora e a inclusão de pianos e de alguns sopros abre ainda mais o leque composicional do registo. 
É interessante perceber que apesar do Undertones se encontrarem inseridos geograficamente dentro da complexidade do contexto político/social britânico da época, a banda não procura ser rebelde e contestatária optando por focar-se em temáticas mais divertidas e próprias da suas aventuras quotidianas (os amigos, as namoradas) o que transmite bastante leveza e frescura ao seu trabalho. "Positive Touch" é um registo exemplar que ajuda a reforçar a importância dos Undertones no panorama musical britânico na viragem da década de 70 para 80; e não era por acaso que eram uma das bandas mais referenciadas pelo radialista inglês John Peel... 

domingo, 19 de julho de 2020

Dominion - THE SISTERS OF MERCY


Side A
1 Dominion   5:07
2 Untitled   3:33 
Side B
1 Sandstorm   1:44
2 Emma (E. Brown/T. Wilson)   6:17 

Edição em formato 12" para "Dominion", o segundo single retirado de "Floodland" depois da apresentação com "This Corrosion". "Floodland" foi o segundo álbum de originais dos britânicos The Sisters Of Mercy, editado em 1987, sendo também visto como o primeiro álbum a ser editado após o polémico conflito que opôs todos os membros da formação contra o vocalista Andrew Eldritch, deixando-o sozinho na banda. 
A nova fase dos The Sisters Of Mercy, apenas com Eldritch a liderar, ficou marcada por uma nova sonoridade, mais distante do rock gótico que caraterizou e marcou o primeiro registo oficial. "Floodland" é um trabalho mais eletrónico e atualizado, bastante completo e maquinal, acentuado por fortes batidas. O trabalho de remistura para este 12" funciona como uma dissecação da mistura original que aparece tanto no álbum como no vídeo. A versão de "Dominion" é a mesma mas com uma sonoridade mais aberta, nomeadamente nos coros finais, e não inclui o apêndice "Mother Russia" como no álbum. "Untitled" é uma espécie de adaptação instrumental para "Dominion" mas com um andamento mais arrastado, acompanhado de alguns efeitos de produção, enquanto "Sandstorm" é nada mais nada menos do que o arranjo criado para a introdução da versão integral do belo vídeo de "Dominion", filmado na cidade de Petra na Jordânia. Espaço ainda para a inclusão de "Emma", uma versão para uma música dos Hot Chocolate. "Emma" era uma das versões que os The Sisters Of Mercy originais tocavam ao vivo com alguma frequência mas que nunca conseguiram gravar como devia ser. A versão incluída neste Ep foi gravada em janeiro de 1988 e é bastante interessante por Eldritch a conseguir tornar como uma música muito sua através de uma interpretação muito pessoal.

terça-feira, 14 de julho de 2020

Boogaloo To Beck - Dr. LONNIE SMITH w/ Special Guest DAVID "FATHEAD" NEWMAN


1 Paper Tiger   9:38
2 Tropicalia   5:51
3 Mixed Buziness   8:20
4 The New Pollution   7:12
5 Devil's Haircut   8:23
6 Sexx Laws   6:58
7 Loser   3:16
8 Jack Ass   6:55
9 Where It's At   6:58
10 He's A Mighty Good Leader   5:30
11 Nobody's Fault   9:20    

Curiosa abordagem, em forma de tributo, ao repertório do norte americano Beck por parte de uma formação de jazz liderada por Dr. Lonnie Smith, uma das lendas vivas do orgão Hammond B3. Juntam-se-lhe nesta prestação, Doug Munro na guitarra e na produção, Lafrae Sci na bateria e David "Fathead" Newman em sax tenor, como convidado especial para algumas músicas. 
A carreira de Beck começa a ganhar contornos a meio da década de 90 e evidencia um músico criativo que se mexe no mundo do pop/rock/indie e revela uma miríade de influências que vai espalhando pelos seus multifacetados trabalhos. À data deste tributo, editado em 2003, Beck tinha editado oficialmente seis álbuns e o repertório escolhido por Dr. Lonnie Smith para esta sessão assenta nas músicas mais relevantes dessas edições.
A estrutura do registo é muito fiel ao trabalho de composição dos originais, imediatamente reconhecíveis, apesar dos momentos de improviso em que esta distinta formação aproveita o groove para brincar um pouco com os solos. "Mixed Buziness" contêm uma referência a "Rhapsody In Blue" de Gershwinem "Jackass" é percetível a alusão a "Chameleon" de Herbie Hancock e em "Where It's At" há uma sugestão para o clássico da soul "In The Midnight Hour". A sessão é embalada por uma boa dinâmica, sem tempos mortos e sem exageros, em que a interpretação de Dr. Lonnie Smith se evidencia pela qualidade da sua habitual prestação no orgão Hammond B3. O guitarrista Doug Munro apresenta-se com uma sonoridade límpida e um fraseado muito definido, sempre presente, enquato as aparições de David "Fathead" Newman se distinguem pela precisão cool com que encaixam na estrutura harmónica do registo. O baterista Lafrae Sci quase que apenas se limita a marcar a sessão tendo um momento mais solto em "Loser", a prestação mais curta da edição, com o arranjo mais direto e fortemente apoiado na dinâmica da bateria. Os pontos altos encontram-se em "Devil's Haircut", que começa discreta para atingir alguma emoção nos solos de Smith e Munro, "Jack Ass" e "Where It's At" contêm as interpretações mais completas mas é a subtil atmosfera criada pela interpretação de "Nobody's Fault" que encerra o registo da melhor forma.

segunda-feira, 6 de julho de 2020

Thanks I'll Eat It Here - LOWELL GEORGE


1 What Do You Want The Girl To Do (A.Toussaint)   4:46
2 Honest Man   3:44
3 Two Trains   4:32
4 Can´t Stand The Rain (D.Bryant/B.Miller/A.Peebles)   3:20
5 Cheek To Cheek   2:21
6 Easy Money (Ricky L.Jones)   3:27
7 20 Million Things   2:48
8 Find A River   3:44
9 Himmler's Ring (J.Webb)   2:27

Uma vida de excessos e uma morte prematura aos 34 anos dão azo a que se crie uma lenda. Lowell George passou pelos Mothers de Frank Zappa e dali saiu para formar os Little Feat onde se evidenciou como líder, compositor e guitarrista, numa das bandas rock mais interessantes da década de 70 em território norte americano. Em 1979 editou "Thanks I'll Eat It Here", o seu primeiro e único registo a solo, e foi durante a digressão deste álbum que Lowell George sucumbiu a um ataque de coração. Para a história ficam os registos que gravou e a dúvida quanto ao que mais poderia ter feito. O registo a solo surge numa fase complicada dos Little Feat, o que levou Lowell George a anunciar o final da banda logo após a edição deste trabalho. Uma personagem problemática devido aos seus abusos mas muito respeitada e admirada musicalmente, Lowell George refere nos apontamentos que acompanham esta edição, que este foi um disco que demorou muito tempo a concluir, cerca de dois anos e meio, e foram tantos os intervenientes nas gravações que nesse período de tempo ele acabou por se esquecer de quem faz o quê em cada música. Nos créditos do álbum encontra-se ainda uma longa lista com os vários nomes que terão participado nas gravações e Lowell George convida a que seja o próprio ouvinte a descobrir quem toca o quê, e onde, através do estilo de cada um dos intervenientes. 
É um trabalho feito com alma, e a experiência e segurança de quem sabe o que quer. Lowell George reinventa cinco músicas, "Two Trains" é mesmo uma nova roupagem para uma música gravada anteriormente com os Little Feat, e apresenta quatro novas, sendo "Find A River" uma música do seu colaborador Fred Tackett. A sequência das primeiras quatro músicas é perfeita e sugere algum do espírito rock/funk/soul que caraterizava os Little Feat, "Cheek To Cheek" é uma aventura mariachi, e depois de "Easy Money" o registo entra numa fase mais comedida que fecha com o divertido dixie de "Himmler's Ring", original de Jimmy Webb. No fundo, um trabalho exímio que confirma a capacidade criativa e interpretativa de Lowell George.

terça-feira, 30 de junho de 2020

Hints, Allegations And Things Left Unsaid - COLLECTIVE SOUL


1 Shine   5:05
2 Goodnight, Good Guy   3:35
3 Wasting Time   3:27
4 Sister Don't Cry   3:52
5 Love Lifted Me   3:48
6 In A Moment   3:53
7 Heaven's Already Here   2:13 
8 Pretty Donna (Instrumental)   1:58
9 Reach   4:21
10 Breathe   3:03
11 Scream   3:00
12 Burning Bridges   3:36
13 All   3:29

Em 1992, após várias rejeições à demo com que a banda se tentou dar a conhecer, os norte americanos Collective Soul davam por terminada a sua curta aventura musical. No entanto, houve uma música dessa demo que chamou a atenção de uma rádio e entretanto houve mais rádios a aperceber-se do potencial dessa mesma música. Foi "Shine" que despoletou o interesse nos Collective Soul, e que levou a que a banda se voltasse a reunir em 1993 para dar resposta aos contatos que então começaram a surgir. "Hints Allegations And Things Left Unsaid" nasce das raízes dessa demo e fica registado como o seu primeiro trabalho oficial. 
Surgidos em pleno período de domínio grunge, mostram-se algo desenquadrados pela sua sensatez e por apresentarem uma sonoridade mais limpa e consciente relativamente à agressividade da concorrência. O coletivo herdou a tranquilidade e organização mais clássica das linhagens soft e folk rock conseguindo ainda aproveitar o recurso de possuir uma formação sustentada por três guitarras que lhes permite trabalhar, a par das vozes, com boas harmonias. Num registo que se apresenta com um bom equilíbrio de canções, a banda apenas se "excede" em "Love Lifted Me" e "Scream", com o resto do álbum a ser sustentado por canções inteligentes e bem estruturadas. A meio do registo, surgem em formato acústico para "Heaven's Already Here" e aproveitam a utilização de um quarteto de cordas para uma pequena peça instrumental, de cariz classicista, como "Pretty Donna". Do restante alinhamento destacam-se o single "Shine", o pop rock de "Goodnight, Good Guy" e "Reach", a distinta sensibilidade de "Sister Don't Cry", as harmonias de "Breathe" e a clara inspiração nos Beatles para o efeito das segundas vozes em "All".

terça-feira, 23 de junho de 2020

Luna Dance - BUNNYRANCH


1 Your Words Are My Jokes   3:13
2 Flip Flop   3:22
3 We Got This Thing   3:23
4 Let Me Understand   3:08
5 Can't Stop The Ranch   2:47
6 The Dog   3:12
7 In The Land Of The Poor   3:23
8 On My Way Out   4:24
9 Inside My Head   3:20
10 It's Gonna Be Ok   3:14
11 Give Me Back My Gold   3:01

Terceiro registo de originais para os conimbricenses Bunnyranch, editado em 2006, Luna Dance é mais uma torrente de rock'n roll made in rio modego tal como Kaló e companhia habituaram as audiências. Neste trabalho há a inclusão de um novo membro nas teclas, João Cardoso substitui Filipe Costa, da formação original, e Gui dos Xutos e Pontapés toca saxofone em "Your Words Are My Jokes" e "In The Land Of The Poor". A voz feminina que se ouve em "In The Land Of The Poor" pertence a Cláudia Efe dos Micro Audio Waves. 
Luna Dance apresenta em pista onze canções de formato curto, fluídas numa combinação de estilos rebeldes que se sucedem agilmente desde o rock mais clássico ao punk rock, com passagem pelo garage rock e uma discreta espreitadela ao gospel, mas no final é tudo rock'n roll e é isso o que realmente interessa por aqui. O registo é funcional mas a combinação clássica da formação composta por guitarra, baixo e bateria, com orgão, torna-se algo repetitiva ao longo de todo o álbum valendo a exceção dinâmica de músicas como "Let Me Understand", "Can't Stop The Ranch", "The Dog", "In The Land Of The Poor" e "Inside My Head" que apesar de elaboradas debaixo da mesma fórmula conseguem, ainda assim, demonstrar alguma elegância e frescura. You can't stop the ranch!

terça-feira, 16 de junho de 2020

Mindgroovin' Moodtravellin' - SOUNDS OF THE COFFEECOMPANY #1


1 Makeda - LES NUBIANS   4:55   
2 Femiliarise - KEZIAH JONES   3:40
3 Ease My Mind - ARRESTED DEVELOPMENT   4:08
4 You're The One - BOOSTER   3:19   
5 I Got The... - LABI SIFFRE   2:53
6 What Do You Want (L. Vandyke) - ADAM FAITH   0:49
7 Samba In Solitude - EDC   3:56      
8 Canto De Osanha (B.Powell/V. de Moraes) - DAÚDE   4:01   
9 Mentira - MARCOS VALLE   3:39   
10 Flying Right - KV5   3:39   
11 Full Clip - GANG STARR   3:35
12 Certified - GURU'S JAZZMATAZZ feat. BILAL   4:35   
13 Run To The Sun - N*E*R*D   4:49
14 It's Been Done - ANGELA McCLUSKEY   3:54
15 Feel Like Makin' Love - D'ANGELO   6:21
16 Poetry Man (P.Snow) - ZAP MAMA   5:38
Bónus track
17 I'll Be Seeing You - FRANÇOISE HARDY & IGGY POP

É escassa a informação que se consegue encontrar relativamente a esta coletânea editada em 2005, em formato cd. As poucas referências disponíveis indicam ser uma coletânea elaborada pela empresa coffeecompany, sediada nos Países Baixos, que terá sido produzida à semelhança das coletâneas criadas pela Starbucks em 1995 e pela Benneton em 1999. Com distribuição e venda a cargo da EMI Netherlands, a presente edição será composta por músicas que fariam parte, certamente, da ambiência habitual da cadeia de lojas de café, cuja deliciosa e colorida seleção musical foi feita pelos fundadores Dick de Kock e Rick Bekkema em colaboração com Michael MacDonald e Arne Halsema. Haverá decerto algum intuito promocional por detrás da edição mas trata-se de um registo de bom gosto musical que reúne vários nomes e estilos e encontra-se seccionada pelos variados géneros da seguinte forma:
O simpático soul jazz das Les Nubians abre as hostes em francês seguindo-se-lhe a pop nigeriana de Keziah Jones, o hip hop dos norte americanos Arrested Development, a reminiscência de Prince no acid jazz do francês Booster e esta primeira secção fecha com o funk/soul do britânico Labi Siffre, um original de 1975 que Eminem utilizou como sampler para um dos seus primeiros grandes êxitos em 1998. Há um curto interregno com uma curiosa música de Adam Faith, datada de 1959, e na secção seguinte aborda-se o perfume brasileiro da lounge/bossa, com os EDC, e da MPB, por Daúde e pela abordagem funk soul de Marcos Valle. A good vibe eletrónica de KV5 introduz a coletânea no hip hop oldskool de Gang Starr, na streetsoul de Guru e no cool hip hop rock dos N*E*R*D de Pharrell Williams. A vertente final da compilação centra-se num ambiente mais pop, com a escocesa Angela McCluskey a contribuir com umas das faixas mais cativantes de toda a seleção, mas ainda se cruza com a sensualidade do funk/neo soul de D'Angelo, outra reminiscência de Prince, e com a lazy beat dos belgas Zap Mama para "Poetry Man" de Phoebe Snow. A edição encerra com uma faixa bónus em que a francesa Françoise Hardy partilha a interpretação de "I'll Be Seeing You" com Iggy Pop.

terça-feira, 9 de junho de 2020

Landing On Water - NEIL YOUNG


1 Weigth Of The World   3:40
2 Violent Side   4:22
3 Hippie Dream   4:11
4 Bad News Beat   3:18
5 Touch The Night   4:30
6 People On The Street   4:33
7 Hard Luck Stories   4:06
8 I Got A Problem   3:16
9 Pressure   2:46
10 Drifter   5:05    

Neil Young atravessou os anos 80 de forma irreverente, através da edição de vários trabalhos em que aproveitou para se distanciar da habitual sonoridade rock/folk com que brindou o seu público na década anterior. Ao domínio da energia das guitarras elétricas e da destreza das guitarras folk sucedeu o fascínio pelos sintetizadores e a viagem inclui ainda uma aventura rockabilly e uma passagem pelo country. Momentos controversos perante uma dedicada base de fãs que não aceitou uma mudança tão radical. 
Landing On Water é um dos trabalhos "malditos", foi editado em 1986, após o country de "Old Ways", sendo um registo que não encaixa de maneira nenhuma no estilo habitual de Neil Young mas encaixa perfeitamente no contexto de trabalho utilizado na época e demonstra o quanto a criatividade de Neil Young se pode expandir. O produtor Danny Kortchmar e o baterista Steve Jordan foram os únicos elementos que participaram na gravação deste registo, para além da presença de um coro em "Violent Side" e "Touch The Night". Danny Kortchmar assume o trabalho de produção a par de Neil Young e assume também algum trabalho dos sintetizadores e de algumas guitarras, numa sessão em que não há crédito de nenhum baixista. A irrepreensível participação do baterista Steve Jordan é notável e digna de registo, através de uma prestação arrebatadora e preponderante no resultado final deste trabalho. Neil Young começa por aparecer algo "sóbrio" mas acaba por se revelar igual a ele próprio em momentos como "Hippie Dream", "Touch The Night", "I Got A Problem", "Pressure" e "Drifter". Entre o restante alinhamento, "Violent Side", "Touch The Night" e "People On The Street" destacam-se como as músicas que apresentam a estrutura musical mais completa. Um trabalho distinto, marcado pelo empenho e entrega de uma formação invulgar que consegue preencher todos os espaços do álbum. Para ouvir sem preconceitos.